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Por Paulo Lima
O Brasil é um país de reduzido número de leitores e poucas livrarias. Acrescente-se a esse insosso lugar-comum o fato de que os livros aqui publicados são, em média, considerados caros, para que tenhamos uma perspectiva nada alvissareira da nossa relação com a leitura.
Alguns dados comprovam esse quadro pouco estimulante. No Brasil, o número de leitores é de 17 milhões. Sessenta por cento do faturamento do mercado editorial provém dos livros didáticos. Significa dizer que esse nicho responde por uma boa fatia das publicações lançadas no mercado. Podemos inferir que, sendo livro didático, arregimentará um público mais determinado pela exigência de um programa escolar do que pelo hábito pessoal de ler.
Os restantes 40% do nosso mercado editorial são repartidos entre livros técnico-científicos (19,5%), obras gerais (19,6%) e religiosos (7,3%). Existe, portanto, todo um território a ser desbravado por nossas editoras, desde que um número paralelo de novos leitores venha a ser conquistado, um contingente que sabe ler, mas não lê – o que os lingüistas costumam chamar de analfabeto funcional -. Atribuir esse analfabetismo à concorrência dos meios de comunicação ou à pouca eficácia dos métodos escolares é verdadeiro, mas não move uma palha em direção a uma possível saída para o problema.
O estímulo à leitura requer alguns toques de sedução que se contrapõem às imposições tão típicas da escola, a qual, sob o pretexto de estar prestando um bem libertador ao aluno, exigindo-lhe precoces leituras machadianas, lança-o num purgatório de ódio e horror aos livros para o resto da vida. Incentivar os não-leitores a ler é um ato de conquista.
Apostando nessa conquista é que o escritor e poeta Gabriel Perissé escreveu o livro Ler, Pensar e Escrever. Sem indicar receitas prontas, o pequeno livro (são 95 páginas de puro deleite) começa por uma indagação: ler é bom?
Ler é bom demais, afirma Perissé, um auto-proclamado professor em desespero de causa. E a causa é das mais nobres: incutir o gosto pela leitura, pelo diálogo, pela curiosidade, pelo ato de pensar e de escrever.
E por que vale a pena ler? Eis um dos argumentos possíveis dados pelo autor: Uma primeira resposta é que os livros fornecem bastante matéria intelectual e emocional. As idéias e os sentimentos não caem do céu nem brotam no jardim. Ler é alimentar-se espiritualmente, é adquirir aquela inquietação interior – bem como uma série de convicções -, a indescritível riqueza íntima de quem está atento à vida, de quem carrega consigo a vontade de conhecer e amar infinitamente. Mas é óbvio que os livros não são o único caminho para se adquirir uma cultura humanista. Perissé ressalva que é preciso, entre outras coisas, que convivamos com pessoas que saibam conversar. ‘Papear’ sobre os mil e um temas da vida com colegas e amigos razoavelmente cultos e que utilizem bem da linguagem excercita-nos o raciocínio e potencia a nossa capacidade de entender e, como conseqüência da reciprocidade numa conversa, de fazer-nos entender.
A leitura requer o prazer da descoberta, que é íntima e intransferível. Essas descobertas devem obedecer o estágio de amadurecimento de cada um:
As crianças que, desde os primeiros anos de vida, se habituam a manusear livros infantis coloridos e ouvem histórias inventadas pelos pais e avós; que, mais tarde, lêem aventuras cujos protagonistas são crianças da sua mesma idade; que, com o tempo, conhecem autores estimulantes como Michael Ende, Monteiro Lobato, C.S.Lewis, Hans Christian Andersen, Mark Twain, Júlio Verne, e tantos outros; essas pessoas sentem um imenso prazer na leitura, porque experimentaram esse prazer e modo adequado às etapas da sua vida, e em doses certas, até o ponto de tomarem consciência de que, juntamente com o prazer que oferece, a leitura transmite raciocínios, faz germinar idéias, ensina silenciosamente a escrever e a falar com clareza, estimula a imaginação, amadurece a sensibilidade e etc.
A leitura, portanto, é uma condição indispensável para pensarmos e escrevermos melhor. É um modo de esgarçar a nossa visão de mundo, normalmente estreita e condicionada: Ao nosso ‘eu’ acrescentam-se e mesclam-se contribuições vivas de outras cabeças e corações humanos. Assimilando, digerindo estas contribuições, estaremos nos auto-educando em vistas de um aperfeiçoamento pessoal que, por sua vez, refletirá nas nossas ações, e, dentre elas, em tudo aquilo que dizemos e escrevemos.
A estrada é longa, nela não cabem atalhos ou bifurcações mágicas. Urge que cada um estabeleça seu próprio caminho. Para aprender e adquirir o gosto pela leitura, só lendo. E para escrever, só mesmo tentando escrever: Para aprender a escrever é preciso escrever. E, para escrever, cada pessoa deve procurar, encontrar e ir sempre aperfeiçoando uma técnica pessoal que a ajude a explorar e exprimir os seus talentos, a sua personalidade, as suas idéias, os seus sentimentos, tudo o que aprendeu, tudo o que é.
A contribuição de Gabriel Perissé certamente nos ensina a sermos um pouco mais e nos capacita a expressar os talentos que dormitam dentro de nós.
Por Anna Luiza